segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Leis de proteção animal no Brasil e no mundo – Parte I

Por Fátima Chuecco (da Redação)
O que esperar das leis brasileiras no que diz respeito à proteção animal? Se o projeto de lei, recentemente aprovado no Senado, que visa um a quatro anos de prisão para quem maltrata animais for legitimado, conseguiremos colocar assassinos atrás das grades? Ou ainda temos um extenso terreno a percorrer até que punições mais severas sejam de fato aplicadas, como já acontece em outros países?
Em alguns lugares, quando há flagrante, quem maltrata aguarda julgamento na cadeia. Em outros, menor de idade responde por qualquer crime, inclusive de maus-tratos a animais. No mundo inteiro surgem manifestações pelo bem-estar animal. Até nos países mais criticados por abuso, como a China, está havendo pequenos avanços. Mas será possível, finalmente, colocar assassinos de animais na cadeia no Brasil?

Manifestação na Avenida Paulista. Foto: Divulgação
Para entender melhor como foi o processo até chegar numa possível alteração da Lei 9.605/98 de maus-tratos a animais vamos voltar um pouquinho no tempo. De dois anos para cá assistimos as piores atrocidades contra animais ao mesmo tempo em que parecia crescer o número de defensores.
A mídia embarcou no tema e trouxe à luz casos inspiradores e dramáticos. Vimos resgates fantásticos, mas também crueldades inimagináveis. Casos como do Lobo (arrastado por veículo), da Jade (queimada), do Titã (enterrado vivo), da Lana (espancada até a morte) e a descoberta de uma serial killer que matou centenas de animais perfeitamente saudáveis, enganando protetores que acreditavam estar colocando os bichinhos em boas mãos (Caso Dalva).
Foram cenas revoltantes, mas que ajudaram o Brasil a acordar. A vontade de acabar com a impunidade se espalhou como um vírus (do bem) e se transformou num movimento que ganhou as ruas em janeiro desse ano em diversas cidades brasileiras: o Crueldade Nunca Mais. Quem participou se emocionou. Foi um marco na proteção animal no Brasil reunindo só na Avenida Paulista, em São Paulo, cerca de 10 mil pessoas.
Imagem: Divulgação
Especialistas comentam a alteração na Lei
Dessa emergente necessidade de se fazer alguma coisa pelos animais surgiu uma comissão composta por juristas e outros profissionais que criaram um texto sugerindo alterações na lei 9.605/98 e ampliando a pena de três meses a um ano de detenção para um a quatro anos de prisão. A alteração foi apresentada às pressas mediante a Reforma do Código Penal e que poderia transformar os maus-tratos em meras infrações administrativas. Ou seja, o que já era ruim ficaria ainda pior.
O primeiro passo foi dado em maio com a aprovação no Senado e agora o texto passa por mais algumas etapas até chegar à Presidência da República. Para compreender o que de fato muda com esse novo texto, Luiza Nagib Eluf, procuradora de Justiça do Ministério Público de SP, que fez parte da comissão elaboradora do anteprojeto e Wladimir Viveiro, advogado e procurador jurídico, dão seus pareceres a respeito.
Com a alteração da pena de prisão, o infrator será preso mesmo se tratando de réu primário? Ele terá direito de reverter a pena para trabalhos comunitários?
Luzia – Com previsão de pena de um a quatro anos de prisão há a possibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, com prestação de serviços à comunidade. Tal fato não significa impunidade, a prisão não é a única forma de punir.
Wladimir – O aumento da pena de prisão não coloca os infratores na cadeia, pois, mesmo que condenados à quatro anos, poderiam cumprí-la em regime aberto conforme as normas do Código Penal Brasileiro, além de que, sendo réus primários, dificilmente a pena atingiria o máximo previsto. O que aconteceria, efetivamente, é que o infrator teria uma “passagem”, ficaria “fichado”, mas isso já se consegue com a lei atual.
Luisa Mell em protesto pelo agravamento de penas contra crueldades contra animais. Foto: Reprodução
E se o infrator já tiver passagem pela polícia?
Wladimir – A condenação por outros crimes não o leva, necessariamente, para a cadeia, até mesmo porque há o entendimento de que não se trata de uma reincidência específica.
A enfermeira Camila, que matou a yorkshire Lana, seria condenada à cadeia se esse projeto de lei estivesse em vigor na época?
Wladimir – Ela poderia ser condenada a quatro anos já que teve também o constrangimento da menor que assistiu aos maus-tratos. Mas certamente cumpriria a pena em regime aberto. Para conseguir que cumprisse pelo menos parte da pena em regime semiaberto ou fechado, ela teria que ser condenada a, no mínimo, quatro anos e um mês de prisão. Há um projeto de lei de iniciativa popular solicitando pena de dois a seis anos (http://protecao.no.comunidades.net). Nesse caso haveria mais chances de colocar infratores como a Camila na cadeia.
Por que esse projeto de iniciativa popular ainda não propôs alterações na Lei 9.605/98?
Wladimir – Ocorre que não é cultura no Brasil participar de projetos de iniciativa popular embora os mesmos tenham mais força perante o Orgão máximo de aprovação que é o Poder Legislativo e a Presidência da República. São necessárias 1, 5 milhão de assinaturas em papel (não pode ser feito de forma eletrônica, pela internet, por exemplo) e isso dificulta a coleta.
Manifestação em Joinville (SC), em 22 de janeiro de 2012. Foto: Daniel Pereira/Divulgação
O que poderia ser melhorado no projeto de lei já aprovado no Senado?
Wladimir – Há uma forma de aproveitar esse projeto de lei para que possa garantir a prisão dos infratores. Pelo menos os maus-tratos de extrema violência (animais espancados até a morte, queimados vivos, arrastados por carros, mutilados etc) poderiam ganhar um parágrafo em que ficasse determinado que o cumprimento da pena, qualquer que fosse sua dosagem, tivesse início em regime fechado, devendo o condenado sujeitar-se às regras de progressão, ou seja, passando do regime fechado (cadeia) para o semiaberto (colônia agrícola) e depois para o aberto (albergue). Uma pena de prisão mínima de um a três meses não poderia ser, em hipótese alguma, convertida em multa, trabalho comunitário ou prisão aberta ou semiaberta, mesmo em se tratando de réu primário. Um parágrafo que obrigasse a uma pena mínima dessas poderia, ao menos, ter um efeito psicológico sobre a população contribuindo para que os casos de maus-tratos diminuíssem.
Se por ventura o agressor for condenado e preso, a quem deverá ser entregue o animal?
Luzia – Se o agressor for preso e não houver ninguém mais para cuidar do animal, certamente ele será institucionalizado, provavelmente encaminhado para o Serviço de CCZ ou a alguma entidade que receba animais sem tutor, a fim de ser oferecido em adoção.
Manifestação em Foz do Iguaçu. Foto: Reprodução
No caso do agressor ser considerado culpado, porém não ser preso por decisão judicial, ele perderá a guarda do animal no caso desse sobreviver?
Luzia – O Projeto de Código Penal não fez previsão expressa de perda da guarda do animal. No entanto, acredito que poderia ser aplicada essa perda de guarda como uma das penas alternativas, restritivas de direito. O condenado por maus-tratos não tem condições de continuar cuidando do animal.
Por quais outras etapas o projeto de lei deverá passar até que seja colocado em prática? Qual a estimativa da data para sua aplicação?
Luzia – O projeto de lei está, no momento, sendo objeto de análise pelo Senado. Foi criada uma Comissão de Senadores específica para estudar o trabalho da Comissão de Juristas. É difícil fazer uma previsão de quanto tempo o projeto levará no Senado, mas sabemos que após os trabalhos dos senadores o projeto será enviado à Câmara dos Deputados onde será novamente analisado e, eventualmente, modificado. Em seguida, voltará para o Senado para aprovação final. Sendo otimista, calculo uns dois anos.
Veja a segunda e última parte dessa matéria: Como estão as leis de proteção animal no resto do mundo? Em alguns lugares dos Estados Unidos a pena pode chegar a 10 anos de prisão. Menores de idade respondem por maus-tratos a animais na Austrália. Na França, faz parte da rotina da polícia comum atender denúncias de maus-tratos.
fonte: anda

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