As minorias étnicas da região norte do Camboja conservam a prática de sacrifícios e outros ritos animistas nos quais a influência externa adotou novos fetiches como o telefone celular e o avião.
O animismo, uma religião que concede a cada objeto ou elemento da natureza uma alma que faz com que sejam venerados, é hoje a crença mais extensa entre os povos indígenas cambojanos, que por meio de rituais tentam aplacar as iras dos espíritos ou ganhar favores para ter boa saúde e bem-estar.
"Cada família acredita em seus próprios espíritos. Depende do que é mais importante para sua vida: a caça, a pesca ou a agricultura", explica Khieng, um jovem da etnia tompuon, uma das maiores do país.
Os espíritos são além disso caprichosos e podem decidir sobre a vida e a morte, segundo as crenças destas comunidades, que habitam principalmente nas áreas remotas das províncias de Ratanakiri e Mondulkiri, no nordeste do país.
"É melhor não enfurecê-los porque podem ser muito vingativos", diz Khamphay Ay, um curandeiro indígena que afirma manter comunicação com os espíritos para curar doenças.
Os curandeiros como Khampay se encontram na escala mais alta da estrutura social das tribos, o que reflete que conhecer os desejos destes fantasmas da natureza é vital para elas.
"Há pessoas que por mais remédios que tomem nunca serão curadas. Estão doentes porque em seu interior habita um espírito mau e é preciso fazê-lo sair", afirma o xamã, enquanto lê o futuro de uma mulher observando um ovo de ave e outros objetos.
Este curandeiro conta que o sacrifício de um animal é sempre o melhor método para acabar com qualquer mal, embora sua maior ou menor eficácia dependa do animal escolhido para o rito.
Um frango, que por exemplo custa um punhado de dólares, serve apenas para curar doenças leves, enquanto se a necessidade for curar uma doença grave é necessário um animal maior, pelo menos um búfalo, apesar de um exemplar custar cerca de US$ 500, isso pode representar o endividamento de uma família durante muito tempo.
Estes sacrifícios costumam ser realizados após a morte de algum membro da comunidade com a finalidade de que o espírito do animal vele por ele durante sua nova vida.
"Um ano depois da morte fazemos um segundo sacrifício e colocamos os totens diante do túmulo como proteção", diz Sopa, um homem de 65 anos que cuida do cemitério de seu povoado e dedica momentos de seu tempo a preparar sua própria sepultura.
"Este é meu lugar, embora ainda não tenha feito o caixão", diz o coveiro, que pertence à minoria kavat.
Como as almas vagam pelo outro mundo, os túmulos, protegidos por um precário e colorido telhado, são decorados com móveis e utensílios do lar ou representações destes para facilitar seu itinerário pelo além.
A tradição de outrora tem agora toques de modernidade visíveis nas sepulturas sobre as quais os animistas cambojanos colocam telefones celulares ou miniaturas de aviões, para que seus seres queridos possam se comunicar do novo mundo ou viajar para onde desejarem.
A única novidade técnica que as tribos animistas repudiam é a câmera fotográfica, que afirmam se tratar de uma bomba que rouba a alma e a congela.
Os indígenas afirmam que atualmente é mais difícil aplacar a ira dos espíritos porque cada vez mais eles dispõem de uma extensão menor de florestas para vagar por causa do desmatamento para cultivos como o da mandioca.
Segundo o Ministério de Desenvolvimento Rural, no Camboja existem 17 minorias étnicas, que em conjunto reúnem cerca de 140 mil pessoas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
verdade na expressão