Por Aparecida Negreiros (em colaboração para a ANDA)
A situação de má conservação do piso no Quebra-Mar, no bairro da
Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, tem sido motivo de queixa dos
moradores, mas também está servindo como campanha contra os gatos do
local. Duas matérias publicadas com informações incompletas no Jornal O
Globo, uma em abril e outra em agosto, estão contribuindo para um
serviço de desinformação e preconceito contra os animais.
A menina Lígia com o gatinho Manhoso, um de seus vários amigos gatos do Quebra-Mar. (Foto: Eduardo Assumpção)
As matérias da jornalista Leandra Leal sugerem a retirada dos gatos
do Quebra-Mar, mas a conclusão que se tem chegado em várias partes do
mundo é que, ao contrário do que se imagina e que se pretende, a
transferência de colônias de felinos, seja feita por qual método, não
elimina de forma efetiva a presença dos mesmos naquela localidade.
Retirar uma colônia de gatos deixa o território livre para ser novamente
colonizado. Novos gatos tomarão o lugar dos anteriores e os problemas
antigos regressarão (o chamado “efeito de vácuo”). No entanto, castrar
os gatos da colônia e deixá-la no seu território quebra este ciclo de
repovoamento. Os felinos são extremamente territoriais e, ao adotarem
certo território, geralmente não permitem que outros felinos dali se
aproximem. Essas informações são baseadas em instituições de referência
no assunto como a “Feral Cat Coalition” de San Diego, na Califórnia,
Estados Unidos.
Reprodução
de matéria veiculada pelo site de O Globo, em 12/04/2012 a outra
matéria foi veiculada em 16/08/2012. (Foto: Reprodução)
Enquanto se discute a situação do Quebra-Mar alguns cidadãos, como
Ana Claudia Cardoso, cuidam ou cuidaram por um período dos felinos do
local. Ana explica que os gatos estão quase todos castrados e vai
adiante:
- Castrados com o dinheiro do nosso bolso, trabalho que deveria ser
realizado pela prefeitura. Os gatos são alimentados todos os dias e
levados ao veterinário, quando necessário, também com dinheiro do nosso
bolso. Sempre que possível são colocados para adoção, também por nós.
Nossos potes de água são constantemente jogados fora, por uma pequena
quantidade de pessoas. Isso se chama falta de respeito, falta de
educação e cultura. Não temos gatos doentes. Temos algumas pessoas que
os ameaçam com pedras, paus, cacos de vidro. Reclamar de bichos, hoje em
dia, é cafona, fora de moda, e não cabe mais no mundo que estamos
vivendo!
Cristina Palmer, advogada e vice-presidente da ONG Oito Vidas completa:
- Animais castrados e cuidados, como é o caso dos animais do
Quebra-Mar, não expõem pessoas a doenças. Muito pelo contrário. Eles
ajudam a conter a população de animais rasteiros, ratos e outros que,
somados à urina, fezes e lixo (de humanos) que se espalham nesta cidade,
poderia se tornar um desastre e, com certeza, expõem todos nós a
doenças.
A colaboração da mídia é fundamental para que fique pública a real
situação desses gatos, que têm direito à vida e fazem parte da cidade do
Rio com o status de animais comunitários, e estão, portanto,
devidamente protegidos pela lei Nº 4.956, DE 3 DE DEZEMBRO DE 2008.
O gato Teco, que está castrado, passeia contente no local onde mora, o Quebra-Mar. (Foto: Ana Cardoso)
Mas não é só no Quebra-Mar onde é possível constatar esforços para
cuidar dos animais abandonados. Cada vez mais pessoas, empreendimentos e
condomínios estão se mobilizando para castrar, alimentar e manter os
animais. Essa nova atitude é uma resposta ao triste resultado da
negligência e da irresponsabilidade das pessoas que, no momento
apropriado, não castraram os seus animais, permitindo uma procriação
desenfreada. Portanto cuidar de animais abandonados nas ruas vai além da
proteção animal. É um trabalho de ética, respeito pela vida e saúde
pública. E por falar em saúde, é comum usar o argumento da Toxoplasmose
para apavorar as pessoas na tentativa de remover gatos. Conforme Maria
Regina Reis Amendoeira, Pesquisadora Titular Chefe do Laboratório de
Toxoplasmose do Instituto Oswaldo Cruz, citada na matéria do jornal O
Globo de agosto sobre os gatos do Quebra-Mar, escreve em seu artigo: A
importância dos animais de produção na infecção por Toxoplasma gondii no
Brasil:
“A toxoplasmose … tem sido usualmente atribuída à ingestão de carnes
cruas ou mal cozidas, de animais de produção infectados, sendo a taxa de
infecção destes animais de grande importância para o estudo desta
protozoose… Animais infectados possuem grande quantidade de cistos do
parasita em variados órgãos e músculos e estes não são detectados
durante a inspeção da carne nos abatedouros. Esta revisão enfatiza
aspectos da protozoose em suínos, caprinos e ovinos, bovinos, equinos e
aves visando esclarecer o potencial de cada espécie como fonte de
infecção do parasita, principalmente no Brasil.”
Portanto é importante destacar o risco de contrair toxoplasmose por
meio da ingestão de carne crua ou mal passada. Ressaltando que no Brasil
muitos abatedouros são clandestinos, nesses locais faltam condições
adequadas de higiene, sofrimento de animais e riscos para a saúde
humana. A mídia tem um importante papel na sociedade, pois a
disseminação das informações corretas pode facilitar a união de esforços
na busca e concretização de soluções. Quem sabe todos nós, cidadãos,
possamos ser contemplados de uma próxima vez com uma matéria sobre não
abandono e posse responsável de animais, importância de castração no
controle populacional de cães e gatos, consumo sem crueldade contra
animais. Uma matéria que fale sobre a convivência humana respeitosa com
os animais. Segundo uma publicação da prefeitura de Curitiba, humanizar
uma cidade significa que uma nova consciência deve ser assumida: a de
que TODOS os seres têm direito à vida, à liberdade e à expressão de
comportamentos próprios de sua espécie. Portanto, devem ser tratados com
dignidade.
Para saber mais sobre as reportagens do jornal O Globo acessar os links:
http://oglobo.globo.com/barra/quebra-mar-na-barra-esta-cheio-de-gatos-4626503
http://oglobo.globo.com/barra/quebra-mar-esta-sujo-malconservado-5797962
Fonte: anda.jor.br