segunda-feira, 29 de julho de 2013

O que o veganismo tem a ver com ajuda humanitária?

Algumas horas na Praça da Sé, em São Paulo, bastaram para entender melhor a situaçãoPor Fabio Chaves, fundador e infoativista do Vista-se
Na noite desta sexta-feira (26), tive o privilégio de participar pela primeira vez de uma ação social direta, uma distribuição de sopa vegana para moradores de rua da Praça da Sé, em São Paulo.
Não escrevo para me vangloriar disso, na verdade, tenho um pouco de vergonha de não ter me envolvido mais nisso antes. A organização foi de um grupo de alunos da USP, o Veganusp (Facebook), fui realmente só para ajudar.
Eu já sabia que o ambiente seria pesado, mas gostaria de compartilhar com vocês alguns pontos importantes de uma experiência destas e, quem sabe, inspirá-los a fazer o mesmo.
Diferente da sensação que a gente tem quando vê as pessoas jogadas no chão ou usando crack pela televisão, na Praça da Sé eu pude enxergar seres humanos atrás dos farrapos e dos cachimbos de crack. A situação social é realmente agravada pelo tráfico de drogas e o crack ali é tão comum (ou mais comum) do que copos de água.
Entrar com um copo de sopa e um pedaço de pão em cada mão nos lugares mais escuros da praça pedindo licença e dando boa noite aos usuários de crack foi uma coisa que tive que respirar fundo antes de fazer. Mas, para minha grata surpresa, a maioria têm um grande respeito por quem entrega alimentos e roupas por lá, e agradecem demais. Uma mulher até chorou, agradecendo o trabalho, só por eu ter dado um boa noite e esticado a mão com um copo de sopa. Algumas pessoas que estão fumando crack abaixam a cabeça para agradecer a sopa escondendo o cachimbo improvisado atrás das costas, num claro sinal de que têm vergonha da situação em que se encontram.
É claro que este tipo de atividade é assistencialista e não resolve, de fato, o problema. Eu não sou a favor de ficar apenas servindo alimento para as pessoas ali, mantendo-as vivas para continuar consumindo drogas. O que realmente resolve o problema é atitude política e, claro, educação. É um trabalho a longo prazo.
Mas, voltando aos poucos e instrutivos momentos que passei na praça. Eu vi pessoas com mais de 70 anos dormindo no chão molhado e frio, levantando os olhos e agradecendo tanto pela atenção quanto pela sopa. Na verdade, ouvi de um morador de rua que nem todas as pessoas que vão lá distribuir sopas são educadas ou falam com eles. E eles valorizam talvez mais a dignidade de ser tratado de igual para igual do que a comida em si. Precisa ser olho no olho.
Quando eu passava de carro pela região do centro de São Paulo, tinha uma visão mais afastada do que acontece ali. Agora, pelo menos eu sei como é lá dentro e posso afirmar com certeza que a maioria não gostaria de estar ali, se sentem humilhados, rejeitados e completamente perdidos. Um cara de uns 2 metros de altura parou para perguntar para uma das pessoas que distribuia sopa se a gente estava ali também com a intenção de levar alguém para internar, para tratar a questão da dependência química. Ele disse que gostaria de sair dali, de se internar e sair daquela vida. Não precisava nem dizer, estava no olhar da maioria das pessoas.
Vimos também um jovem com menos de 30 anos pegar um copo de sopa e cair pra trás, com claros sinais de overdose. Ele chegou a parar de respirar por alguns instantes. Um estudante, de mochila e tudo, se jogou no chão e começou a fazer boca-a-boca para salvar a vida dele. E salvou. Alguns minutos depois chegou a guarda municipal, sem muito tato pela frequência com que isso acontece, e, aos poucos, o rapaz se levantou e foi continuar a sobreviver. Não se sabe até quando.
Muitas crianças eu também vi, brincando em meio a centenas de ratazanas que, no fundo, e na minha opinião, também são animais vítimas da urbanização. Crianças são sempre crianças e, mesmo no frio e com uma garoa fina, corriam pra lá e pra cá sorrindo, com a sopa na mão.
Eu estava com uma blusa que tinha a famosa frase de Tom Regan: “Não queremos jaulas maiores, queremos jaulas vazias.” O autor se referia aos Direitos dos Animais mas, ali, fazia completo sentido ao animal humano também. Um morador de rua se aproximou, me segurou pelo ombro, leu o que estava escrito e saiu balançando a cabeça em sinal positivo, sem falar mais nada.
Me senti muito pequeno ontem. De fato, o veganismo precisa levantar mais a bandeira social, seja com ações como esta ou com aproximação política. Todos, veganos ou não, precisam se envolver mais nisso. É muito triste ver nossos semelhantes naquela situação, foi uma experiência incrível que, com toda certeza, irei repetir.
fonte: vista-se

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