Uma onça macho de aproximadamente dois anos e meio, que vinha sendo criada em cativeiro desde que era filhote em uma comunidade da zona rural do município de Jutaí (a 751 KM de Manaus), foi resgatada no último final de semana pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Ela está recebendo tratamento no Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), mas até janeiro deverá ser encaminhada para um criadouro particular no Mato Grosso do Sul.
Em Manaus, segundo o veterinário e analista ambiental do Ibama, Diogo Lagroteria Faria, os dois únicos espaços com estruturas para receber animais silvestres resgatados – Cigs e Hotel Tropical – estão lotados.
Diogo Faria foi o responsável pelo resgate do animal, cujo transporte até Manaus foi feito por avião da Força Aérea Brasileira (FAB). Como em Jutaí não tem pista aérea, o avião pousou no município vizinho de Fonte Boa. Faria seguiu de lancha até Jutaí, fazendo o sentido inverso já com o animal.
A operação de resgate levou três dias para ser realizada. Faria usou medicamento para anestesiar o animal apenas para mantê-lo tranqüilo e colocá-lo em uma caixa de transporte. A técnica usada para a sedação é por meio de uma zarabatana e dardo já consagrada por veterinários de fauna silvestre.
Agressiva
Segundo Diogo Faria, a onça chegou no sítio na zona rural de Juraí levada por um caçador que havia matado a mãe do animal. Durante dois anos e meio, a onça vinha sendo tratada como animal doméstico. Ela era alimentada e mantida em um abrigo de madeira de oito metros de comprimento, três de largura e apenas dois metros de altura.
Ao tornar-se jovem, porém, ela tornou-se agressiva, colocando as pessoas em risco. A onça já havia fugido duas vezes do cercado, mas capturada por meio de armadilhas feitas por comunitários.
“Um animal desse nunca vai se tornar dócil e doméstico. Por volta dos dois anos, os hormônios começam a falar mais alto. Sente necessidade de reproduzir, de procurar mais espaço. É um animal silvestre”, disse Faria.
Batizada de João pelos moradores do sítio, a onça pesa entre 60 e 70 quilos. Apesar de viver durante mais de dois anos em um local fechado, a onça aparentemente está bem de saúde. Também não possui problemas nutricionais. No Cetas, ela vem sendo alimentada e nos próximos dias passará por exame médico do veterinário, coleta de sangue e será microchipada.
Por ser órfã e não receber aprendizado da mãe, a onça não tem condições de passar por reabilitação e voltar à natureza. “É praticamente impossível fazer a soltura. Ela não aprendeu a caçar, a se esconder e está acostumada com a presença humana. Se soltar, a primeira coisa que vai fazer é procurar uma casa. As chances de ele morrer são grandes”, explicou o veterinário.
Caça
A criação de felinos silvestres como animais domésticos no interior do Amazonas é mais comum do que se imagina, segundo Faria. Entre 2005 e 2010, o Ibama resgatou 29 felinos (oito onças pintadas, dez jaguatiricas, cinco gatos mouriscos, quatro suçuaranas e dois gatos macarajás).
Dos 29, 17 foram para mantenedores de fauna (pessoas com autorização do Ibama) e oito para zoológicos (3 deles em Manaus). Outros quatro morreram.
“Cada um desses bichos, a gente imagina, teve a mãe morta. Isso significa que os felinos estão sofrendo uma grande pressão de caça. E esse número são de casos que chegaram até nós. Outros podem ter morrido ou não chegaram ao nosso conhecimento”, conta Faria.
Faria lamenta que para muitas pessoas as onças continuem sendo vistas como inimigas. A justificativa para matá-la é sempre o da necessidade da defesa. “A legislação diz que matar animal silvestre por legítima defesa é autorizado. Mas isso não pode ser usado como desculpa”, alerta.
Conforme Faria, 95% do ataque da onça a uma pessoa (em geral um caçador) acontece quando ela está acuada ou com filhote.
A onça também acaba virando “vítima” do ser humano quando, por falta de comida suficiente na mata, ela se aproxima da casa de comunitários para atacar animais domésticos.
Calma
“No interior do Amazonas, a casa das pessoas é quase uma continuação da floresta. É comum ocorrer esse tipo de conflito. Esse convívio sempre vai existir. Quanto mais a comunidade tiver histórico de caça, mais provável esse tipo de conflito existir. Por isso é bom que os animais domésticos sejam recolhidos a noite e que se evite caminhar sozinho nas matas, principalmente no início do dia e final da tarde”, explica.
O veterinário afirma que é possível escapar do ataque da onça, bastando manter a calma. A atitude que jamais se deve adotar é correr porque, instintivamente, o animal correrá atrás. “Tem que deixar um caminho livre para ela ir embora. Se você está em grupo, não dispersar e se afastar lentamente, e andar sem dar as costas”, conta.
Faria diz que essa orientação é adotada por vários pesquisadores que atuam nas florestas e a atitude sempre dá certo. “Os pesquisadores tiveram esse cuidado e a onça simplesmente olha para eles e vira para o lado. Mas se tentar ir para cima e encarar, ela vai atacar”, explica.
Fonte: A Crítica
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