domingo, 7 de julho de 2013

Porque Me Tornei Vegetariano – A Justificação do Vegetarianismo

Este artigo, de autoria de Antonio Carlos Therezo Mattos, discute o paradoxo do argumento religião como justificativa para a necrofagia e o consumo da "carne" dos animais.

Ao invés de focar sua atenção em argumentos racionais, ou no aspecto ético e compassivo relacionado à opção de não consumir os corpos dos animais, muitos ainda preferem discutir com base no que julgam ser "argumentos bíblicos", em que "deus" recomendaria ou não __ dependendo do ponto de vista do que se queira "demonstrar" com a chancela divina __ o sacrifício de animais para fins alimentares da humanidade. 

Uma discussão equivocadamente baseada neste tipo de "extração seletiva" de textos contraditórios de um Livro que, na verdade, foi escrito por HOMENS ao longo de diversos séculos da História,  nunca nos aproximará do verdadeiro entendimento de que os animais tanto necessitam. 

De qualquer forma, o autor, de forma muito inspirada, dispõe-se a "resolver este conflito de interpretações", pondo um fim nesta interminável discórdia entre "fiéis". 
Independentemente da minha falta de paciência com este tipo de ladainha religiosa, acabei por achar este artigo EXCELENTE, sobretudo porque escrito com a visão ampla de um teósofo, e não um carola frequentador de sermões, de mente obtusa e hipnotizada.
Vou guardá-lo e usá-lo sempre que este tipo de situação voltar a se repetir na página do Cadeia.
Norah

 Porque Me Tornei Vegetariano – A Justificação do Vegetarianismo 

 Antonio Carlos Therezo Mattos


Vegetarianismo é o sistema alimentar que exclui a ingestão de qualquer alimento que implique em tirar a vida de uma criatura do reino animal. Portanto , a nosso ver , a alimentação vegetariana é aquela que não admite a ingestão de corpos de animais , aves e de peixes, admitindo, por sua vez , o consumo de ovos, leite e derivados , exatamente por não haver , neste caso, sacrifício de vida animal.

Uma vez esclarecido o significado aqui adotado para vegetarianismo, entendemos que o tema merece ser examinado no mínimo sob três pontos de vista : da biologia , do cristianismo e do ponto de vista espiritual .  

A Perspectiva da Biologia 
Sob esse prisma , interessa-nos a comparação das características anatômicas dos animais carnívoros com as dos herbívoros. Registre-se que esta abordagem tradicional inclui inúmeros tópicos , mas aqui trataremos de apenas três : 

-Todos os animais carnívoros possuem dois pares de dentes especiais,muito maiores que os outros dentes, que são chamados “presas”. Estas têm a função de prender e rasgar a carne dos corpos que lhes serve de alimento. Por outro lado , os herbívoros possuem todos os dentes do mesmo tamanho, com insignificantes diferenças. Logo se vê que a Natureza nos construiu semelhantes aos herbívoros , e claramente distintos dos carnívoros , pois não fomos providos das chamadas “presas”. 

- Todos os carnívoros bebem água lambendo-a com a língua. Ao contrário, os herbívoros , e também os humanos , não utilizamos a língua para lamber a água , mas sorvemos a água , chupando-a para dentro da boca. 

- O intestino dos animais carnívoros (como o leão,tigre, onça, etc) mede cerca de um metro apenas, e isto é explicado como uma necessidade do animal expelir rapidamente o que restou da carne digerida. E faz sentido, porque a putrefação de qualquer organismo começa no instante em que a vida dele se vai. 

Por outro lado, o intestino dos animais herbívoros (como o elefante, o boi , o cavalo),são muito mais longos, medindo cerca de oito metros , e este comprimento varia com o tamanho e o peso do animal. É interessante notar que o intestino humano mede, em média, quatro metros, e também varia em função da altura e do peso da pessoa. Ou seja , nossos intestinos são muito diferentes dos intestinos dos animais carnívoros, que assemelha-se a um tubo reto , curto e grosso. Os intestinos humanos , bem mais longos e sinuosos, são muito mais parecidos com os intestinos dos herbívoros, não guardando qualquer semelhança com os intestinos dos animais carnívoros. 

 Estes são apenas alguns dos fatos bastante conhecidos e indiscutíveis , entre os inúmeros que a Natureza nos apresenta,sugerindo que nos coloquemos de acordo com ela: os corpos humanos foram feitos herbívoros e não carnívoros . 

Cumpre acrescentar que este enfoque do vegetarianismo através da anatomia comparada pode ser bastante ampliado e aprofundado , mas não o faremos neste espaço. 




 A Perspectiva Bíblica (ou Cristã) 

 Começando por Gênesis 1:29 – “Eis que vos tenho dado todas as ervas que produzem sementes, as quais se acham sobre a face de toda a terra, bem como todas as árvores que dão frutos que dão sementes; isso será vosso alimento”.

Como se percebe, na dieta alimentar prescrita em Gênesis pelo Criador para os seres humanos não há uma só palavra sobre a ingestão de carne. 

 Entretanto, em LEVÍTICO 11 , a Bíblia diz : 
“Falou o Senhor a Moisés e a Arão, dizendo-lhes: 
dizei aos filhos de Israel: estes são os quadrúpedes que podereis comer dentre todos os animais que há sobre a terra: 
Todo animal que tem casco fendido, partido em duas unhas e que rumina, esse podereis comer”… 

De pronto, verifica-se que a orientação de Levíticos entra em choque com aquela contida em Gênesis. Como harmonizá-las? 

Há uma série de engenhosas interpretações que sustentam que a permissão para o consumo de carnes contida em Levíticos foi uma exceção, destinada apenas a resolver uma situação temporária  e que, portanto, tal licença teria expirado há muito tempo. 

Sem desmerecer tais interpretações, preferimos procurar superar este impasse lançando mão de procedimentos mais práticos e simples. 
Esse tipo de impasse entre duas orientações contrárias costuma ocorrer no mundo jurídico, com alguma freqüência. E como os juristas resolvem tais problemas? 
Pelo conceito da hierarquia das leis, isto é, buscando descobrir qual das duas orientações possui mais valor. 

No mundo jurídico, as leis são estabelecidas em ordem decrescente de importância. 
Seria, grosso modo, da seguinte forma: 
1º) A Constituição Federal 
2º) Leis complementares 
3º) Leis Federais Ordinárias 
4º)Leis Estaduais 
5º) Leis Municipais 
6º) Decretos 
7º) Resoluções, etc. 

De maneira que, ocorrendo uma contradição entre dispositivos legais distintos, prevalecerá aquele que estiver melhor situado na hierarquia previamente definida e aceita. Nada mais justo e racional que isto.

Assim, para podermos aplicar este procedimento ao nosso impasse, temos que procurar a Lei Maior, aquilo que pode ser considerado a essência , a parte mais importante da Bíblia , ou a sua “Constituição”.  

Felizmente , neste caso, a tarefa é elementar . Desde a mais remota antiguidade , os “Dez Mandamentos” tem sido reconhecidos como “a lei”. 
 Como se sabe , o Decálogo foi revelado a Moisés há vários milênios , e, apesar de alguns duvidarem disso, continua em vigor até hoje. Há inclusive uma passagem bíblica que registra o expresso referendo do Mestre aos Dez Mandamentos : 

(Mateus 5:17:)” Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas; não vim revogá-los, mas dar-lhes pleno cumprimento.” 
Portanto, não se discute a supremacia dos Dez Mandamentos em relação a todos os outros comandos/orientações contidos na Bíblia. 
 E o que diz o sexto mandamento? 
“NÃO MATARÁS”. 




Simplesmente isto. 
É preciso que se diga que , frente a este mandamento, as pessoas geralmente são levadas a pensar que o texto se refere à matança específica de seres humanos.(Eu mesmo pensei assim até há poucos anos).

Entretanto, se analisarmos atentamente este ponto, verificaremos que não está escrito “Não matarás seres humanos”. O comando da Bíblia é aberto e geral, e não contém nenhuma especificação ou restrição. Portanto, “NÃO MATARÁS” significa, clara e objetivamente, não matarás nenhum ser vivo.





Nesse sentido, é bastante razoável supor que se o Legislador Máximo quisesse prescrever uma conduta em que se evitasse apenas e tão somente o assassinato de seres humanos, a Lei teria sido apresentada de outra forma.
Do mesmo modo , não nos parece razoável supor que Moisés, ou ainda pior, que o próprio Criador tenha se descuidado no texto da Sua Lei Magna .

Os juristas referendam o procedimento aqui aplicado através de um brocardo latino: “UBI LEX NON DISTINGUIT NEC NOS DISTINGUERE DEBEMUS”.
Significa que onde a lei não distingue , não cabe ao intérprete distinguir (ou especificar).

No caso em questão , significa que se o Legislador Máximo não especificou o comando , não cabe aos seres humanos restringir o amplo significado da norma divina.
 
Na qualidade de Lei Fundamental dentro do contexto bíblico, o comando encontrado no sexto mandamento, de maneira clara e insofismável, se sobrepõe e neutraliza as instruções contidas em Levíticos 11, reforçando e fazendo prevalecer aquelas inicialmente prescritas em Gênesis 1:29. 

Em suma , se tivermos a coragem necessária para alcançar e apreender o verdadeiro espírito, a essência do cristianismo , chegaremos inexoravelmente ao vegetarianismo , a exemplo do que fez Ellen G. White . 

A Perspectiva Espiritual 

A rigor, se pudéssemos sintetizar numa só idéia, qual teria sido a única modificação introduzida por Jesus na antiga Lei? Sem dúvida foi enfatizar a supremacia da Lei do Amor, com todas as suas nuances, como a compaixão, misericórdia, a benevolência, a tolerância, etc.( Vide I Coríntios 13 , de 1 a 13). 

E se o Mestre pregou a benevolência, a misericórdia e o amor até para os culpados e pecadores, como poderia concordar com o massacre dos seres mais inocentes, como os animais?

 Curiosamente, a supremacia moral da visão compassiva enfatizada pelo Mestre do Amor constituiu novidade apenas para o Ocidente, pois o conceito “AHIMSA” (não violência), já existia e era praticado há muitos milhares de anos no Oriente. 

 As pessoas que se tornam vegetarianas por razões exclusivamente de saúde poderiam retornar à dieta carnívora se as teorias médicas mudassem. E , como temos visto , elas mudam todos os dias. Assim, novas idéias poderiam derrotar o ponto de vista “espiritual”, ou compassivo. Mas nada pode mudar a percepção intuitiva da natureza preciosa da vida, sob qualquer forma que exista, por mais insignificante que a criatura possa parecer. Isto inspira na mente, de modo espontâneo, um sentido de cuidado, carinho e amor por todas as criaturas de Deus. 




Os métodos modernos de massacre de animais e de produção de carne são tão abomináveis que mesmo uma pessoa sem motivos espirituais para tornar-se vegetariana, deveria fazê-lo. Antigamente, quando as pessoas pensavam em comer carne, matavam o animal. Hoje, os animais são mortos em massa, e depois se tenta criar um mercado. As pobres criaturas são mantidas em condições atrozes e antinaturais, miseravelmente confinadas, alimentadas e medicadas artificialmente, e maltratadas de muitas maneiras diferentes. 

É necessário um coração muito duro para não ser vegetariano – quando os fatos da produção de carne são conhecidos.
(Se você estiver interessado em aprofundar o entendimento dessas questões , sugiro duas simples providências : visite um matadouro , ou , se preferir , acesse o sitewww.meetyourmeat.com




Se eu conhecesse estas condições, e mesmo assim me beneficiasse da dor dos animais criados para a produção de carne, eu seria muito pouco humano. 

 Centenas de milhões de pessoas na Índia têm sido vegetarianas por milênios e infindáveis gerações, sempre com boa saúde – não só fisicamente, mas têm tido pleno poder mental e sabedoria espiritual. O território de “AHIMSA” produziu naturalmente os videntes dos Upanishads, o Buddha, Mahavira, Gandhi , e uma série sem igual de místicos e homens santos, e por essa razão, mesmo agora, embora haja uma perceptível decadência, as pessoas olham para a Índia como a terra natal da espiritualidade. 
É interessante notar que muitas pessoas notáveis que experimentaram uma revelação mística – freqüentemente chamada de expansão da consciência – tornaram-se naturalmente vegetarianas. 
Nesse grupo estão pessoas como Shelley, Wagner e Charlotte Bronte, cujo “background” era contrário ao vegetarianismo, mas que o escolheram mesmo assim.

Porque existe uma relação direta entre o fato de não matar e a abertura da visão espiritual, ou percepção religiosa. 

A crença amplamente majoritária, entre nós ocidentais, de que os animais não têm sentimentos, é uma negação das evidências diretas que os animais dão de seus sentimentos: a devoção e alegria expressadas ao retorno do dono, a dor, e até as lágrimas quando machucados. 
Tudo isso é visível para toda pessoa que não fechar deliberadamente seus olhos. 
Como podemos negar ao animal o direito de viver, que nos reivindicamos para nós mesmos, e a oportunidade de ser livre e feliz que vemos como nosso direito inalienável? 
Os animais também foram criados por Deus, e portanto, também são filhos de Deus. 




Acredito que o caminho para o bem estar não está em promover a nossa própria satisfação às custas de outros, ou em prolongar nossa vida causando sofrimento a outras criaturas – seres humanos, animais, aves, peixes, ou outros quaisquer. 

Toda e qualquer agressão deve ser evitada sempre que possível. Nenhum ferimento deve ser causado conscientemente a outro ser. Assim, a Lei da Causa e Efeito que vigora na Natureza trará, por si mesma , o que é bom. 

Pelo fato de hoje tantas pessoas violarem aquela Lei, há crescentes dificuldades e sofrimentos. 

A Lei da Causa e Efeito encontra-se enunciada por toda a Bíblia , tal como em Gálatas 6:7 , ” O que o homem plantar , aquilo mesmo colherá ” , mas também pode ser localizada em Mateus 16:27 , em Lucas 6:37, em Jeremias 31: 30 , em Ezequiel 18:4 a 31 , em Lucas 12:59 , em João 5:14 , em Apocalipse 13:9 e 10 , e em 22 : 12 , em Romanos 2:1 a 15 e 6:2, em I Coríntios 3:8 e 3:13 , em II Coríntios 1:15 , em I Pedro:1:17 , em II Pedro 2:13 , em Efésios 6:8 , em Mateus 5 :18 , 5:25 , 6:12 , 6:14 e 13: 36, em Apocalipse 2:23 e 20:12 , e em dezenas de outras passagens. 

Esta mesma lei foi reconhecida pelo físico inglês Sir Isaac Newton , que a denominou de Lei da Ação e Reação, e resolveu , no século XVII , descrever e circunscrever seus efeitos apenas ao campo da matéria física. 
Conhecido como uma das maiores inteligências que a humanidade produziu , sendo também profundamente religioso e culto , Newton certamente sabia das implicações metafísicas e universais da Lei da Causa e Efeito , mas a decisão de publicar o seu alcance restrito apenas ao campo da matéria física muito provavelmente deveu-se à época em que vivia , quando por muito menos se ia parar nas fogueiras da Santa inquisição.) 
Hoje as pessoas acreditam que ter um coração impiedoso em relação aos animais __ e tratar milhões deles como se fossem objetos, materiais inertes que podem ser abertos e manipulados numa fábrica produtora de carne  __ não tem qualquer efeito negativo sobre a sociedade humana, mas, ao contrário, a beneficia. 

Esta é uma gigantesca falácia. 

Porque os seres humanos estão treinando a si mesmos para serem indiferentes ao sofrimento  e brutais no seu modo de pensar, e irão agir, inevitavelmente, com grande insensibilidade em relação à sua própria espécie . 

 E é exatamente isto que estamos vendo atualmente. 

O modo gentil de viver, a simpatia e a sensibilidade para com o bem estar de todas as criaturas, e uma capacidade de apreciar o caráter sagrado da vida, são necessários para construir uma civilização boa e pacífica . 





Namaste.

 Artigo originalmente publicado em: 

http://www.teosofia-liberdade.org.br/porque-me-tornei-vegetariano/






Nenhum comentário:

Postar um comentário

verdade na expressão