quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Animal mais profundo do mundo é um insecto sem asas nem olhos

Espécie foi encontrada por bióloga portuguesa a dois mil metros de profundidade

 

Por Susana Lage

Plutomurus ortobalaganensis (Crédito: Ana Sofia Reboleira)

Plutomurus ortobalaganensis (Crédito: Ana Sofia Reboleira)

Na gruta mais funda do mundo, Ana Sofia Reboleira descobriu cinco novas espécies de insectos, o escaravelho Catops cavicis e quatro colêmbolos: Anurida stereoodorata, Deuteraphorura kruberaensis, Schaefferia profundissima e Plutomurus ortobalaganensis. Este último é o animal terrestre mais profundo de sempre ao ser descoberto a uma profundidade de 1980 metros abaixo da entrada da cavidade.
“Num ambiente aparentemente abiótico, como são as grandes profundidades cavernícolas, onde a luz do sol jamais entra e onde os recursos alimentares são extremamente escassos e as temperaturas muito baixas, é realmente notável encontrar-se vida”, revela a bióloga portuguesa ao Ciência Hoje.

A descoberta resulta da expedição ibero-russa de Verão do CAVEX Team em 2010 à cavidade Krubera-Vorónia, localizada na Abcásia, uma área remota perto do Mar Negro, nas montanhas do Cáucaso Ocidental.
Aqui, a bióloga da Universidade de Aveiro e o colega espanhol Alberto Sendra do Museu Valenciano de História Natural, levaram a cabo uma série de prospecções biológicas em diferentes partes da caverna que é a única do mundo que ultrapassa os dois quilómetros de profundidade (2191 metros abaixo do nível do solo).

Bióloga portuguesa num dos meandros da gruta (Credito: Javier Le Pera)

Bióloga portuguesa num dos meandros da gruta (Credito: Javier Le Pera)

“Todo o trabalho no interior da cavidade é duríssimo, as temperaturas são muito baixas e o risco de hipotermia é permanente, não se pode parar muito tempo no mesmo sítio e os animais que recolhemos são muito raros e difíceis de encontrar, implicando muitas horas de busca”, explica Ana Sofia Reboleira.
A gruta onde os cientistas realizaram a expedição é conhecida desde os anos 60 e foi protagonista de sucessivos recordes mundiais de profundidade desde 2001, mas nunca se tinham efectuado estudos bioespeleológicos no seu interior.
“Fomos surpreendidos por uma biodiversidade superior àquela que esperávamos a tão elevadas profundidades. Não se conheciam animais cavernícolas a viver abaixo dos mil metros de profundidade”, afirma a bióloga portuguesa.
As novas espécies descobertas, descritos por Rafael Jordana e Enrique Baquero na revista científica Terrestrial Arthropod Reviews, são insectos diminutos, sem asas, olhos, pigmentação, que vivem em total escuridão e que há milhões de anos desenvolvem mecanismos de adaptação que lhes permitem viver a grandes profundidades.
De equipamento às costas
Para Ana Sofia Reboleira e os outros expedicionários que fizeram parte da equipa CAVEX 2010 chegarem à cavidade Krubera-Vorónia, localizada na Abcásia, foi necessário passar pela Rússia e cruzar a fronteira a pé com todo o equipamento às costas. A subida à zona do acampamento foi feita em camiões militares que carregaram as seis toneladas de equipamento necessário, como material de espeleologia, de mergulho e comida para 30 pessoas durante 30 dias.

Ana Sofia Reboleira na entrada da gruta Krubera-Voronia (Credito: Alberto Sendra)

Ana Sofia Reboleira na entrada da gruta Krubera-Voronia (Credito: Alberto Sendra)

Os camiões cruzaram a zona de floresta e subiram às montanhas do Cáucaso, deixando os investigadores na base do vale do Ortobalagan, onde estão situadas várias grutas profundas, entre as quais a Krubera-Vorónia. Todo o material foi carregado pelos expedicionários desde a base do vale até à zona da entrada da cavidade, onde se estabelece o campo espeleológico. Este trabalho durou quatro dias.
Depois instalaram quase três quilómetros de cordas por toda a cavidade e assentaram os acampamentos subterrâneos. A comunicação com a superfície em cada um dos acampamentos subterrâneos era possível através de um fio de telefone instalado na cavidade.

Sobre a investigadora

Ana Sofia Reboleira nasceu nas Caldas da Rainha a 6 de Outubro de 1980. É licenciada, mestre e doutoranda em Biologia pela Universidade de Aveiro. Já publicou diversos artigos científicos, dando a conhecer novas espécies para a Ciência. Desde 2004, passa largas temporadas em instituições científicas no estrangeiro, como na American University, Universidade de La Laguna, Universidade de Alcalá, Universidade de Barcelona, Consiglio Nazionale delle Ricerche e Estação Biológica de Roscoff. Actualmente é presidente do Núcleo de Espeleologia da Universidade de Aveiro e membro da Sociedade Internacional de Biologia Subterrânea. Em Maio de 2008, a Federação Portuguesa de Espeleologia atribuiu-lhe a primeira edição do prémio de mérito cientifico-espeleológico pelo seu labor científico em prol do inter-associativismo.

.cienciahoje.

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