sábado, 11 de outubro de 2014

Ingrid Newkirk "É hipocrisia comer carne e dizer que respeita os animais"

ição:  2148 |  07.Jan.11 - 21:00 |  Atualizado em 11.Out.14 - 16:37

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A fundadora da principal ONG do mundo de defesa dos bichos fala do seu marketing de guerrilha e do papel das celebridades no ativismo
Claudia Jordão
Confira vídeo que revela as estratégias ousadas da ONG Peta para proteger os animais :
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CONQUISTA
“Nossa maior vitória talvez tenha sido acabar
com os testes de segurança de veículos
em animais vivos”, diz ela
  
Se hoje a indústria automobilística não submete mais animais vivos a testes de segurança de veículos, se o contingente de veganos (quem não come carne por convicções éticas) cresce, se usar casaco de pele deixou de ser o símbolo-mor do luxo para estar associado à crueldade contra os bichos, boa parte da responsabilidade por esses comportamentos é de Ingrid Newkirk. Britânica, 61 anos, ela passou a infância na Índia, onde a maioria dos habitantes é vegetariana e onde teve sua primeira lição sobre respeito aos animais. Há 30 anos, ela fundou a Peta – People for the Ethical Treatment for Animals (Pessoas por um tratamento ético aos animais), a maior ONG do mundo de defesa dos direitos dos bichos. Sua fama vem do apoio de algumas celebridades, como Paul McCartney, e da agressividade com que trata outras. Recentemente, a Peta invadiu a página no Facebook da grife Donna Karan e escreveu “Assassina de coelhos!” Motivo: a estilista, que havia cedido aos protestos da Peta para não usar pele em suas coleções, voltou atrás. O marketing de guerrilha faz parte do DNA da ONG. Ao mesmo tempo que é tachada de radical, coleciona fãs em todo o planeta.
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"Gisele Bündchen fez campanha de uma grife
de peles e a Peta invadiu um desfile dela. Uma mulher com a
influência que ela tem deveria ter consciência de seus atos”


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“Lady Gaga é jovem e ansiosa por atenção. Ela não fez (usou
vestido de carne) por mal, não pensou nas implicações
de expor um animal retalhado"
  

 

 

ISTOÉ -
Que motivos existem para comemorar os 30 anos da Peta?
INGRID NEWKIRK -
Ter mudado milhares de mentes, aberto olhos e corações e conquistado vitórias concretas, que realmente fazem a diferença. A maior delas talvez tenha sido acabar com os testes de segurança de veículos em animais vivos. Até recentemente, a GM colocava porcos vivos na pista para testar o impacto nos carros. Nunca tivemos receio de enfrentar gigantes como a GM e a Procter & Gamble, por exemplo, que praticava a alimentação forçada e o envenenamento de animais em testes de produtos.
ISTOÉ -
Tem ideia de quantas vidas de animais a Peta salvou até hoje?
INGRID NEWKIRK -
Em apenas uma campanha, nós salvamos mais de quatro milhões de animais de serem submetidos a testes químicos. Tratava-se de substâncias químicas que, já era sabido, eram prejudiciais aos seres humanos. O mais importante é que, sempre que alguém evita o sofrimento ou a morte de um animal, há um efeito cascata que contamina outras pessoas. É como se caísse a ficha de muita gente que se sensibiliza e passa a agir de maneira diferente.
ISTOÉ -
Quais ideais continua perseguindo?
INGRID NEWKIRK -
Um mundo sem crueldade, onde as pessoas não ignorem o fato de que animais são feitos de carne e sangue, como nós. Todos eles têm emoções, sentem medo e dor, amor e alegria, e querem permanecer vivos, assim como a gente. Um mundo onde todos prestem a atenção no que os animais são e no que os animais precisam, no lugar de tratá-los como escravos ou de enxergá-los como nada além de algo para comer, vestir, abusar e usar em testes. Sossegarei no dia em que o ser humano não maltratar mais os animais, no dia em que não comer mais carne.
ISTOÉ -
Qual é a maior maldade que ainda se pratica contra os animais?
INGRID NEWKIRK -
Os matadouros, que fariam muita gente vomitar se estivessem dentro deles, só existem porque as pessoas crescem comendo carne e não se importam em assustar, roubar e matar animais para comer carne sangrenta contaminada de urina, fezes e pus. As pessoas ainda vestem pele de animais como os homens das cavernas e acham mais interessante ver elefantes serem acorrentados pelos pés e chicoteados com ganchos para fazer truques idiotas do que vê-los vivendo soltos na natureza com a sua família.
ISTOÉ -
Mas, na natureza, é comum que animais comam outros para sobreviver. Por que só o ser humano deve ficar fora da cadeia alimentar? A Peta não é muito radical?
INGRID NEWKIRK -
Não, não é. No mundo contemporâneo, o ser humano não precisa de carne para sobreviver. Ele pode compensar a ausência da carne no organismo com outros alimentos, que trazem os mesmos nutrientes. A dieta vegana é muito completa e muito nutritiva. É hipocrisia comer carne e dizer que respeita os animais. Se formos honestos com nós mesmos, devemos admitir que é impossível comer o objeto de nosso afeto. Tornar-se vegano não é difícil. O mais complicado é tomar a decisão.
ISTOÉ -
Quais são os maiores inimigos da Peta?
INGRID NEWKIRK -
Todos os açougues, locais que trabalham a pele e o couro de animais, circos com bichos e laboratórios que usam animais como cobaias. Mas o maior de todos os inimigos é a complacência das pessoas. Se todos se dessem conta da força que têm como consumidores e exigissem das corporações um tratamento justo e respeitoso com os bichos, tudo seria diferente. As empresas teriam de se adaptar a essa nova ordem, senão não venderiam mais nada. Ou seja, antes de tudo devemos olhar para nós mesmos e nos perguntar: “eu deveria comprar isso?”
ISTOÉ -
O que a levou a esta causa?
INGRID NEWKIRK -
Fui uma aprendiz lenta e vivi muitas experiências. Crescer ao lado de um cão, que ia sempre aonde eu ia, me fez entender os sentimentos e humores dos animais. Encontrar um porquinho em pele e osso, que foi deixado numa fazenda abandonada para morrer de fome, me fez questionar sobre os horrores de se comer uma costelinha de porco. Pegar uma lagosta viva para colocar numa panela de água fervente me fez parar de comer frutos do mar. Encontrar uma raposa com a patinha presa numa armadilha me fez parar de usar pele. Eu percebi que a maioria das pessoas nunca via o que eu vi, e ainda, como eu, acreditava que gostava dos animais e desprezava a crueldade, mas estava contribuindo para isso. Por essa razão eu fundei a Peta, para mostrar o que estava sendo feito e que há escolhas.
ISTOÉ -
A sra. viveu a sua infância na Índia, um país que tem uma relação única com os animais. De que forma isso a influenciou?
INGRID NEWKIRK -
Sim, passei alguns anos lá, onde meu pai era engenheiro a serviço do governo britânico. Olhando para trás, me lembro de pelo menos uma influência muito forte. O aprendiz de um grande poeta, Rabindranath Tagore, visitou a minha escola quando eu era criança e disse a nós, meninas, para pensar menos em coisas materiais – roupas, meninos e filmes – e começar a admirar a natureza e o fato de que somos apenas um músico na orquestra que é a vida, com as suas plantas e animais.
ISTOÉ -
A sra. tem animais de estimação?
INGRID NEWKIRK -
Viajo demais para ter animais, então sou uma ótima babá de animais quando estou em casa. Quero dizer, cuido de animais que não me pertencem. Não acho justo ter animais se não tenho como dar atenção. Meus dois últimos cachorros foram a Senhora Bea e Conchita Marie, ambas haviam sido abandonadas e foram resgatadas. Eram grandes indivíduos.
ISTOÉ -
A Peta ganhou fama por seu marketing de guerrilha e pela relação com as celebridades. Qual é o famoso que mais veste a camisa da ONG?
INGRID NEWKIRK -
A atriz canadense Pamela Anderson. Ela nunca viaja sem incluir uma ação de proteção aos animais em sua agenda. É uma ótima modelo e um maravilhoso exemplo de mulher com conteúdo. Ela tem um coração enorme escondido por trás daqueles peitões, que chamam tanta atenção, e o usa. Ela já adotou cachorros, usou biquíni de alface, pediu ao Parlamento de Israel para banir o uso de pele de animais, falou com chefes de Estado para julgar casos de crueldade contra animais, e muito, muito mais. Eu a amo.
ISTOÉ -
Como é a relação entre a Peta e a modelo Gisele Bündchen, que já foi repreendida pela ONG?
INGRID NEWKIRK -
Anos atrás, Gisele Bündchen fez uma campanha de uma grife de peles, o que nos irritou muito. A Peta invadiu um desfile do qual ela participava com cartazes de protesto. Ela alegou que a campanha era parte de seu trabalho e que adorava animais. Uma mulher como ela, com a profissão que tem, com a influência que tem, deveria ter consciência de seus atos. Mas, assim como outras celebridades, ela percebeu sua responsabilidade. Gisele concordou em não usar pele em sua vida pessoal. A atriz americana Eva Mendes era outra estrela que usava pele até receber uma carta educada da Peta e um vídeo chocante com a (estilista britânica) Stella McCartney mostrando como os animais eram escalpados vivos para a retirada de suas peles. Ela simplesmente parou.
ISTOÉ -
Costumam enviar esse tipo de carta às celebridades?
INGRID NEWKIRK -
 Sim.
ISTOÉ -
Recentemente, a cantora americana Lady Gaga causou polêmica ao usar um vestido de carne crua. De que forma esse tipo de comportamento contribui para a crueldade contra os animais?
INGRID NEWKIRK -
Lady Gaga é jovem e ansiosa por atenção. Ela não fez por mal, simplesmente não pensou nas implicações de seu ato, que expõe um animal retalhado. Ela concordou em não usar mais pele de animal e tenho esperanças de que deixará de comer carne.
ISTOÉ -
Este ano, a Peta elegeu a atriz americana Catherine Zeta-Jones como a celebridade mais malvestida do ano. Por quê?
INGRID NEWKIRK -
Há uma foto, na qual ela parece uma colcha de retalhos de animais mortos. Ela usa raposas, jacarés, vacas e visons. Isso se torna ainda mais absurdo e intolerável numa era na qual temos tantas roupas glamorosas, feitas desde fibras naturais até sintéticos futuristas.
ISTOÉ -
É sempre um escândalo quando uma celebridade usa um casaco de pele de animal?
INGRID NEWKIRK -
Sim, aos poucos temos mostrado que não há nada de glamoroso nisso. Para que a pele de uma raposa seja aproveitada, por exemplo, o animal é eletrocutado via vagina ou ânus e depois tem os ossos de seu pescoço quebrados. No caso dos répteis, usados para fazer sapatos e bolsas, a pele é arrancada com o animal vivo e, como eles têm sangue frio, levam dias para morrer e sofrem demais. O mesmo acontece com as vacas, que são fatiadas e têm a sua pele arrancada, ainda conscientes.

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